Sucessão familiar: um processo complexo que deve ser planejado

A sucessão em empresas familiares é um processo complexo e desafiador, tanto do ponto de vista emocional quanto estratégico. Ao longo da minha jornada assessorando diferentes grupos familiares, já presenciei empresas que conseguiram êxito nesta jornada e outras em que o conflito se instalou e o negócio passou a ter perdas financeiras e problemas familiares, destruindo o valor financeiro e as relações entre os envolvidos. A cada dia as famílias têm se interessado em fazer um processo o mais planejado e suave, minimizando riscos. Para que um processo sucessório tenha maior êxito, vários elementos devem ser considerados.

1. Escolha do sucessor

• Problemas de meritocracia: Muitas vezes, a escolha do sucessor não é baseada no mérito ou nas habilidades necessárias para o cargo, mas sim em fatores familiares. Isso pode gerar desconfiança entre os membros da família e até mesmo conflitos internos e perda de talentos que a organização possui pela falta de transparência no que se refere à meritocracia.

• Assessment: Um processo sucessório pode envolver mais de um candidato, seja interno ou externo. Um programa de assessment, com mapeamento do perfil e das competências, minimiza o risco da escolha de um candidato com perfil muito distante ao que o negócio demanda.

• Preparação do sucessor: Caso o sucessor seja escolhido internamente, este pode não estar preparado para assumir o papel de liderança. Isso pode acontecer devido à falta de treinamento formal ou experiência prática na gestão da empresa. Um programa individual de mentoria bem estruturado e de coaching irá acelerar o desenvolvimento para que o escolhido tenha maior nível de prontidão para assumir mais rapidamente a posição.

2. Evite conflitos familiares

• Conflitos de interesse: Membros da família podem ter interesses diferentes em relação à condução dos negócios, o que pode gerar tensões e disputas. Além disso, a mistura de questões pessoais e profissionais pode dificultar a tomada de decisões racionais. Essa é uma das maiores armadilhas que deve ser evitada.

• Resistência à mudança: Alguns membros da família podem ter dificuldade em aceitar a mudança, especialmente quando o fundador está presente há muitos anos e a empresa tem uma identidade forte ligada à sua liderança. O fundador construiu um negócio de sucesso por meio de um perfil empreendedor, com visão de negócios, senso de dono. Geralmente os membros da família não possuem esse perfil tão completo. Ou seja, pensar em um sucessor profissional faz muito mais sentido para o negócio.

3. Gestão de expectativas

• Expectativas irrealistas: Os fundadores muitas vezes têm dificuldades em delegar responsabilidades ou em aceitar que a empresa vai mudar sem eles. Por outro lado, os sucessores podem ter expectativas irreais sobre o que podem alcançar ou o ritmo da mudança.

• Desejo de manter o legado: O fundador pode ter a expectativa de manter o legado familiar intacto, o que pode ser difícil de alcançar em um mundo corporativo em constante transformação. A única certeza é a mudança e o fundador tem que estar muito atualizado em relação às novas dinâmicas do mercado e dos negócios. O risco de não abraçar a mudança coloca em risco tanto o negócio quanto o patrimônio conquistado.

4. Profissionalização da empresa

• Dificuldade em profissionalizar a gestão: Em muitas empresas familiares, a gestão é baseada em relações pessoais e familiares, o que pode dificultar a implementação de práticas de governança corporativa ou a contratação de profissionais externos para áreas chave da gestão. Nesse cenário, passa a ser muito mais difícil contratar profissionais altamente qualificados, pois a interferência das relações pessoais e familiares passa a ser desmotivador para os executivos.

• Falta de processos e estrutura formal: A transição para uma gestão mais profissionalizada pode ser desafiadora em empresas que operam de forma informal e dependem for temente da figura do fundador para tomar decisões. Novamente, executivos mais preparados geralmente não querem arriscar suas carreiras em negócios informais e que podem impactar negativamente nas suas carreiras por questões éticas.

5. Sustentabilidade do negócio

• Visão de longo prazo versus curto prazo: Enquanto o fundador pode estar focado na continuidade do legado e na sustentabilidade do negócio, os sucessores podem ter uma visão mais voltada para resultados de curto prazo ou mudanças mais rápidas. Esse pode ser um desafio onde ajuda externa de consultores em estratégia podem contribuir com um estudo mais detalhado e confiável das tendências e mercado no qual a empresa atua.

• Adaptação ao mercado: Empresas familiares, por vezes, têm dificuldade em se adaptar a novas realidades de mercado, tecnologia e inovação, o que pode ser um obstáculo no processo de sucessão, especialmente se a transição não for bem conduzida. Novamente, buscar ajuda externa especializada pode contribuir muito para decisões mais assertivas em relação ao mercado.

6. Questões emocionais

• Laços familiares: A empresa está frequentemente atrelada a sentimentos familiares, o que pode dificultar a separação entre o profissional e o pessoal. O fundador pode ter dificuldades em se desapegar do controle da empresa, o que pode criar um ambiente de insegurança para os sucessores. As questões emocionais são um dos fatores mais complexos de serem gerenciados, pois são intangíveis e não envolvem a lógica que os números nos fornecem. A melhor forma de lidar com isso é evitar conflitos e, caso existam, buscar ajuda de mediadores especializados.

• Sentimento de traição: Outros membros da família podem se sentir excluídos do processo de sucessão, o que gera ressentimentos e pode afetar a harmonia familiar. Em relação a esse tema, é de fundamental importância que cada membro da família tenha seu próprio projeto de vida e carreira, em que possa se realizar, minimizando mágoas desnecessárias.

7. Planejamento sucessório

• Falta de planejamento formal: Muitos fundadores de empresas familiares não elaboram um plano de sucessão estruturado, o que pode causar incertezas na transição de poder e a perda de foco nas estratégias de longo prazo. O planejamento deve começar com anos de antecedência para que a transição seja o mais suave possível, minimizando rupturas e riscos ao negócio.

• Aspectos jurídicos e fiscais: O processo de sucessão envolve questões legais e tributárias que precisam ser bem planejadas para evitar complicações financeiras ou jurídicas no futuro.

8. Perda de identidade e cultura organizacional

• Manutenção da cultura familiar: A transição de liderança pode afetar a cultura organizacional da empresa, especialmente se o sucessor não conseguir manter os valores e a cultura estabelecidos pelo fundador. O tema cultura também é complexo e intangível. Manter os valores minimiza rupturas. Contudo, nada impede que ao longo do tempo o negócio passe por uma transformação cultural planejada e bem implementada.

• Resistência dos funcionários: Funcionários que cresceram junto com a empresa e têm laços com o fundador podem ter dificuldades em se adaptar à nova liderança, o que pode impactar a moral e a produtividade. Mudar o passado não é possível, mas separar as relações pessoais e profissionais é também um processo. Implantar programas de meritocracia é fundamental para que o novo sucessor possa fazer uma gestão profissional.

Ações para superar tantos desafios:

• Planejamento antecipado: É essencial que o fundador inicie o processo de sucessão com antecedência, identificando e preparando o sucessor de forma gradual e estruturada.

• Governança profissional: Implementar uma estrutura de governança sólida, com conselhos e processos claros, pode ajudar a garantir que a transição aconteça de forma mais profissional e sem conflitos.

• Diálogo familiar: A comunicação aberta e honesta entre os membros da família é crucial para lidar com questões emocionais e de expectativas.

• Consultoria externa: Contar com consultores especializados em sucessão pode ajudar a mediar o processo e garantir que a empresa siga prosperando após a transição. A sucessão em empresas familiares é, portanto, um processo que exige cuidado, planejamento e uma gestão cuidadosa das emoções e expectativas envolvidas.

Por Karin Parodi, sócia-diretora do Career Group. Publicado na Revista Fortuna Digital.

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